sonhos e verdades da Rodarte

Tem gente que se interessa por moda porque gosta de consumí-la. Tem gente que se interessa por moda porque a encara como um manifestação criativa. Nesse caso uma pergunta vem de brinde: moda é arte? Essa dúvida está longe de uma solução definitiva. Melhor assim. Enquanto há dúvida, há estímulo para encontrar a resposta.

Entre o compromisso criativo, e o comercial ganha quem consegue ter o melhor dos dois mundos. Parece ser o caso das irmãs Kate e Laura Mullevay, da Rodarte. O comercial para elas não é apenas a rota desfile na semana de moda de Nova York e venda no varejo, vem velado no empréstimo de sua expertise híbrida, em parcerias como uma coleção para a Target, para GAP e para a Open Ceremony, ou no figurino do corpo de baile do filme “Cisne Negro”, e na exposição no Rodarte: States of Matter, que ficou em cartaz no começo do ano no MOCA – Museu de Arte Contemporânea, de Los Angeles.

nan goldin©
Kate e Laura Mullevay, da Rodarte, por Nan Goldin©

Elas passaram pelo Brasil, num evento da Revista Marie Claire que aconteceu no MUBE, aqui em São Paulo, no dia 24. Falaram sobre a trajetória da Rodarte e do mundo híbrido que as circundam. Nem Laura, nem Kate são formadas em moda, uma estudou História da Arte e outra literatura, ambas na prestigiada universidade de Berkeley, também na Califórnia. Aprenderam a costurar com a mãe, a artista plástica Victoria Mullevay. O nome da grife é vem de seu sobrenome de solteira. (vale lembrar que a grife Jack McCollough e Lazaro Hernandez fizeram a mesma brincadeira para nomear a Proenza Schouler).

A inevitável pergunta sobre “o que acharam sobre o Brasil?”, foi respondida por Laura de maneira auto-reflexiva. “O Brasil me fez lembrar porque gosto de morar na Califórnia”, nada pejorativo. Isso em função do clima solar que temos aqui. Ambas se encantaram com a arquitetura moderna do país.

Apresentação da exposição Rodarte: States of Matter

O amor pelo sol não é exatamente perceptível na aparência das duas. Tímidas, e muito branquinhas, não devem ser do tipo que se esbaldam nas praias de L.A. Trabalham muito. Além de criar tem que gerir a grife, pois ainda não estão ligadas a nenhum conglomerado de moda.

Ambas vivem em Passadena, e trabalham em Los Angeles. “Quando éramos criança, a Kate desenhava croqui de vestidos, e eu fazia a planta da casa”, relembra Laura. O trabalho em família é descrito como harmônico e complementar: “nunca temos ideias separadas”, diz. “A Kate é a cabeça do design”, complementa. “A Laura se preocupa muito em como o desfile, com a imagem da marca”, entrega a irmã.

As duas começaram os alinhavos em 2004. O dinheiro para abrir a grife veio de um espreme daqui, aperta dalí, e segundo Kate revelou à Revista Serafina, ela vendeu inclusive sua coleção de discos de vinil para criar a Rodarte com algumas peças. O caminho definitivo rumo aos estrelado começou depois de uma viagem à Nova York. Então, “o lugar mais exótico que já tinham ido”. O deslocamento rendeu uma matéria no site WWD, publicação referência para os fashionistas. Porém, os holofotes ganharam brilho extra quando as celebridades as descobriram. Nicole Kidman foi uma das primeiras. Kristen Dust e Natalie Portman são clientes VIPs.

Natalie Portman de Rodarte©

kirsten dunst  de rodarte©

Mia Wasikowska de Rodarte


Em 2008 ganharam o prêmio Swarovski na categoria moda feminina, dentro do CFDA e em 2009, a consagração absoluta, de melhor estilista de moda feminina, o principal do Conselho de Estilistas dos Estados Unidos. Em 2010 criaram os tutus do filme “Cisne Negro” de Darren Aronofsky, e ganharam as massas.

Para o figurino, tiveram liberdade total. “O balé tinha que ser muito visual. Darren pediu para fazer o que estava ao nosso alcance. Foi bem parecido como criar uma coleção, mas com a diferença de ter gente dançando com as roupas”, observa Kate. Os limites vieram de conversa com os próprios bailarinos. “Queríamos fazer uma coroa de metal, e eles nos alertaram sobre o desconforto do material”, relembra.

Rodarte.net©
prova do figurino de Natalie Portman em Cisne Negro

Rodarte.net©

Na passarela, os limites das irmãs são estipulados por elas mesmas, e pela complexidade das peças que criam. “Fazemos tudo à mão com uma equipe pequena, então, delimitamos o que pode ou o que não pode. Por vezes uma manga muito complexa, por exemplo, pode não valer a pena o esforço”, conta Laura.

Quatro modelos da coleção verão 2012 recepcionavam os convidados da palestra, e anteciparam por meio das estampas, texturas, modelagem e acabamento, o discurso que Laura faria com veemência a seguir: “Não vemos diferença entre arte e moda, é um diálogo continuo”. A coleção foi inspirada em quadros de Van Gogh, que estavam no Museu Norton Simon de Pasadena, mas também tem influência do “Jet Propulsion Laboratory”, laboratório da NASA também localizado na cidade. De pinturas e galáxias, a moda surge.

Rodarte SS 2012

Rodarte SS 2012

Rodarte SS 2012

Paulo Borges, um dos entrevistadores perguntou às duas como estão encarando a crise econômica que afeta os Estados Unidos. Elas rebateram dizendo que como ainda são pequenas não sofrem tanto os efeitos da crise, e como nunca imaginaram chegar onde chegaram, estão prontas para as intempéries. Sobre a luta entre moda conceitual e a comercial Kate lança a frase mais impactante da palestra: “Por que não há mais sonhadores na moda?”.

Sonho e verdade (≠ realidade), são os segredos da Rodarte: “Quando começamos, ninguém botava fé que um vestido enorme, com tanto tecido, podia dar futuro. Sempre fomos honestas com nós mesmas e com o que queríamos fazer. E sabíamos que o que estávamos criando era diferente”, revela Laura.

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