Escolha uma página de maneira completamente aleatória de um dos livros de Gilles Lipovetsky. Alguma frase vai te chamar atenção. Concordando ou discordando, é bem provável que você queira ler o livro todo. Ele escreve e descreve suas ideias com uma certeza contagiante a cada ponto final. Como aqui:
“A moda consumada vive de paradoxos: sua inconsciência favorece a consciência; suas loucuras, o espírito de tolerância; seu mimetismo, o individualismo; sua frivolidade, o respeito pelos direitos do homem. No filme acelerado da história moderna, começa-se a verificar que, dentre todos os roteiros, o da Moda é o menos pior."
Com esta última frase ele termina a apresentação do livro “O Império do Efêmero”, de 1987 e foi com ela que sua palestra aqui em São Paulo começou. Sua fala foi loooooonga, profunda, mas objetiva. Calcada afirmações e exemplos. Não deixa dúvidas. Deixa a vontade de questionamentos sobre o que foi dito, sobre o que vem depois.
Lipovetsky é autor de um livro que chama “Os Tempos Hipermodernos” publicado em 2004. Nele o professor debate as questões essenciais da filosofia: quem somos? para onde vamos?, mas ele acrescenta: o “por que“, o “o que“, o “o onde” e “como” consumir nessa trajetória que ao futuro pertence. Nesse livro ele afirma que estamos nos tempos hipermodernos. Ou seja, o moderno e o pós-moderno sont passées*.
*Lembrando aos leitores queridos que cada uma dessas definições carrega consigo muitas e muitas teorias envolvidas e debatidas por muitos e muitos pensadores. Ser moderno não é tão simples quanto parece.
Dentro desse conceito de hipermoderno há portanto o “hiperconsumismo“. Agora sim, vamos a um resumo do que ele falou na palestra. O texto não é uma transcrição literal do que ele falou e os parênteses são observações e explicações @modapraler.
A proposta da Revistra Trip era refletir sobre o consumo. Ele nos propõe pensar que vivemos em uma sociedade de massa. Porém, hoje também vivemos a hiperindividualização. Pois é, vivemos uma situação paradoxal.
O hiperconsumismo
Lá nos anos 50 quando o modelo norte-americano de consumo ganhou o mundo. O importante era ter bens coletivos : TV, carro e geladeira. Possuir esses objetos era sinônimo de bem estar e status social. Esse sentimento perdurou mais ou menos até os anos 70. Dos 80 até agora isso começou a mudar e hoje cada ser humano quer ter sua própria TV, seu próprio carro, seu próprio computador, seu próprio celular e por aí vai ...”no supermercado você só encontra pequenas porções”, exemplifica.
As empresas e seus profissionais de marketing já perceberam isso e oferecem muitas opções para escolher. É a era da variedade. Nunca tivemos tantas opções para escolher. Ao mesmo tempo, fazer produtos sob medida também está em voga. Se tornou sinônimo de luxo.
Nos anos 50 a diferença entre ricos e pobres era nítida. Hoje as classes sociais se cruzam. Todo mundo tem acesso a lojas como CeA e H&M (nesse momento vale lembrar que ele é francês). Hoje é possível usar uma roupa de grife com a de uma marca popular (olha o high-low de novo aí). A idade não é mais barreira também. “A mãe compra roupa na mesma loja que a filha”, comenta.
Há uma atração irresistível pelo novo. Um vício. (variar, portanto, se tornou um verbo que inconscientemente nos obrigamos a conjugar). Não há mais um modo de consumir que fideliza uma marca ou a outra.
Por outro lado nunca houve tantas marcas e tantos nomes admirados e desejados. As grifes de luxo da moda não sofreram muito com a crise econômica do último ano. As marcas nos dizem o que fazer, como agir, norteiam nosso consumo (lançamentos dos produtos da Apple são uma verdadeira maratona e a Chanel deixou as mulheres viciadas em esmaltes, por exemplo).
Assim, o ato de consumir passou a ter menos relação com a posse, e está mais relacionado ao prazer, a experiência que comprar isso ou aquilo proporciona (a Osklen faz sucesso porque vende “estilo de vida“). Assim, os hotéis não oferecem só quartos, oferecem Spas, opções, gastronômicas ( e os hotéis das grifes como Armani, Versase e Camper... E aqui em São Paulo as imobiliárias oferecem edifícios novos com: espaço Gourmet, Pet Care, Bosque Privativo, fitness center).
Consumir hoje em dia não tem mais barreira de horário, de deslocamento. A tecnologia possibilita isso. O Natal que originalmente era uma festa religiosa, se transformou em um momento em que a orgia de consumo tem benção.
Vivemos a era do hedonismo, onde o indivíduo é um colecionador de experiências. Está eternamente buscando o bem-estar e a satisfação pessoal. Consumir deixa de ser uma necessidade ou um objetivo e pode ser encarado como compensação (shopping em dia de baixo astral é um clássico).
A experiência de comprar hoje, não é mais passiva. O consumidor passa a ditar as regras do mercado, usando principalmente os recursos tecnológicos para expressar sua opinião. A internet proporciona que qualquer ação seja divulgada. A sua experiência de consumo pode ser compartilhada (a vitrine incrível que você viu vai pro twitter e no face book na hora).
Vivemos a era da exposição. Todo mundo pode se mostrar. E de repente a fama pode bater a sua porta, ou chegar por mensagem no facebook.
Conseqüências do hiperconsumismo
Essa busca desenfreada pela auto-saciedade gera uma enorme ansiedade. Não é a toa que depressão é algo corriqueiro, e ioga, budismo, ensinamentos do Dalai Lama e livros de auto-ajuda atraem tanta gente. Voltamos a massificação.
Ele contou sobre uma pesquisa interessante baseada em duas perguntas:
1 Você é feliz? Sim.
2 Os outros são felizes? Não
Resultado da pequisa 90% das pessoas são felizes.
A gente só reconhece nossa própria felicidade?
Conselhos para vivermos em harmonia com o hiperconsumismo
O mercado não é um vilão! Precisos consumir. Gostamos de consumir. Porém, consumir não deve ser o sentido da nossa vida, e sim uma necessidade da economia. O consumo não pode se sobrepor ao amor, a paixão por criar, a espiritualidade. Nós precisamos de amigos, colegas, parentes, amores porque somos seres sociáveis. Não se pode bastar por si mesmo.
E o Brasil nesse mundo louco?
O Brasil pode tirar proveito desse momento de dualidades. As classes sociais se mesclam, a tecnologia se funde com a estética. A roupa cara pode ser usada com barata. O sagrado e o profano convivem. Nós temos essa mistura de raças e culturas na formação do país. A dica é: não consumir o que vem de fora e criar nossos próprios parâmetros, e por que não, fazer o exterior consumir.
***
Foi partindo de um livro sobre moda que ele chegou nessas conclusões... Oui, la mode est très important
“A moda consumada vive de paradoxos: sua inconsciência favorece a consciência; suas loucuras, o espírito de tolerância; seu mimetismo, o individualismo; sua frivolidade, o respeito pelos direitos do homem. No filme acelerado da história moderna, começa-se a verificar que, dentre todos os roteiros, o da Moda é o menos pior."
Com esta última frase ele termina a apresentação do livro “O Império do Efêmero”, de 1987 e foi com ela que sua palestra aqui em São Paulo começou. Sua fala foi loooooonga, profunda, mas objetiva. Calcada afirmações e exemplos. Não deixa dúvidas. Deixa a vontade de questionamentos sobre o que foi dito, sobre o que vem depois.
Emana Imagem & Cultura/ para site Revista Trip
Lipovetsky é autor de um livro que chama “Os Tempos Hipermodernos” publicado em 2004. Nele o professor debate as questões essenciais da filosofia: quem somos? para onde vamos?, mas ele acrescenta: o “por que“, o “o que“, o “o onde” e “como” consumir nessa trajetória que ao futuro pertence. Nesse livro ele afirma que estamos nos tempos hipermodernos. Ou seja, o moderno e o pós-moderno sont passées*.
*Lembrando aos leitores queridos que cada uma dessas definições carrega consigo muitas e muitas teorias envolvidas e debatidas por muitos e muitos pensadores. Ser moderno não é tão simples quanto parece.
"O Tempos Hipermodernos" ed. Barcarolla; "O Império do Efêmero - A moda e seu destino nas sociedades modernas" Ed. Companhia das Letras
Dentro desse conceito de hipermoderno há portanto o “hiperconsumismo“. Agora sim, vamos a um resumo do que ele falou na palestra. O texto não é uma transcrição literal do que ele falou e os parênteses são observações e explicações @modapraler.
A proposta da Revistra Trip era refletir sobre o consumo. Ele nos propõe pensar que vivemos em uma sociedade de massa. Porém, hoje também vivemos a hiperindividualização. Pois é, vivemos uma situação paradoxal.
O hiperconsumismo
Lá nos anos 50 quando o modelo norte-americano de consumo ganhou o mundo. O importante era ter bens coletivos : TV, carro e geladeira. Possuir esses objetos era sinônimo de bem estar e status social. Esse sentimento perdurou mais ou menos até os anos 70. Dos 80 até agora isso começou a mudar e hoje cada ser humano quer ter sua própria TV, seu próprio carro, seu próprio computador, seu próprio celular e por aí vai ...”no supermercado você só encontra pequenas porções”, exemplifica.
As empresas e seus profissionais de marketing já perceberam isso e oferecem muitas opções para escolher. É a era da variedade. Nunca tivemos tantas opções para escolher. Ao mesmo tempo, fazer produtos sob medida também está em voga. Se tornou sinônimo de luxo.
Nos anos 50 a diferença entre ricos e pobres era nítida. Hoje as classes sociais se cruzam. Todo mundo tem acesso a lojas como CeA e H&M (nesse momento vale lembrar que ele é francês). Hoje é possível usar uma roupa de grife com a de uma marca popular (olha o high-low de novo aí). A idade não é mais barreira também. “A mãe compra roupa na mesma loja que a filha”, comenta.
Há uma atração irresistível pelo novo. Um vício. (variar, portanto, se tornou um verbo que inconscientemente nos obrigamos a conjugar). Não há mais um modo de consumir que fideliza uma marca ou a outra.
Por outro lado nunca houve tantas marcas e tantos nomes admirados e desejados. As grifes de luxo da moda não sofreram muito com a crise econômica do último ano. As marcas nos dizem o que fazer, como agir, norteiam nosso consumo (lançamentos dos produtos da Apple são uma verdadeira maratona e a Chanel deixou as mulheres viciadas em esmaltes, por exemplo).
Assim, o ato de consumir passou a ter menos relação com a posse, e está mais relacionado ao prazer, a experiência que comprar isso ou aquilo proporciona (a Osklen faz sucesso porque vende “estilo de vida“). Assim, os hotéis não oferecem só quartos, oferecem Spas, opções, gastronômicas ( e os hotéis das grifes como Armani, Versase e Camper... E aqui em São Paulo as imobiliárias oferecem edifícios novos com: espaço Gourmet, Pet Care, Bosque Privativo, fitness center).
Consumir hoje em dia não tem mais barreira de horário, de deslocamento. A tecnologia possibilita isso. O Natal que originalmente era uma festa religiosa, se transformou em um momento em que a orgia de consumo tem benção.
Vivemos a era do hedonismo, onde o indivíduo é um colecionador de experiências. Está eternamente buscando o bem-estar e a satisfação pessoal. Consumir deixa de ser uma necessidade ou um objetivo e pode ser encarado como compensação (shopping em dia de baixo astral é um clássico).
A experiência de comprar hoje, não é mais passiva. O consumidor passa a ditar as regras do mercado, usando principalmente os recursos tecnológicos para expressar sua opinião. A internet proporciona que qualquer ação seja divulgada. A sua experiência de consumo pode ser compartilhada (a vitrine incrível que você viu vai pro twitter e no face book na hora).
Vivemos a era da exposição. Todo mundo pode se mostrar. E de repente a fama pode bater a sua porta, ou chegar por mensagem no facebook.
Conseqüências do hiperconsumismo
Essa busca desenfreada pela auto-saciedade gera uma enorme ansiedade. Não é a toa que depressão é algo corriqueiro, e ioga, budismo, ensinamentos do Dalai Lama e livros de auto-ajuda atraem tanta gente. Voltamos a massificação.
Ele contou sobre uma pesquisa interessante baseada em duas perguntas:
1 Você é feliz? Sim.
2 Os outros são felizes? Não
Resultado da pequisa 90% das pessoas são felizes.
A gente só reconhece nossa própria felicidade?
Conselhos para vivermos em harmonia com o hiperconsumismo
O mercado não é um vilão! Precisos consumir. Gostamos de consumir. Porém, consumir não deve ser o sentido da nossa vida, e sim uma necessidade da economia. O consumo não pode se sobrepor ao amor, a paixão por criar, a espiritualidade. Nós precisamos de amigos, colegas, parentes, amores porque somos seres sociáveis. Não se pode bastar por si mesmo.
E o Brasil nesse mundo louco?
O Brasil pode tirar proveito desse momento de dualidades. As classes sociais se mesclam, a tecnologia se funde com a estética. A roupa cara pode ser usada com barata. O sagrado e o profano convivem. Nós temos essa mistura de raças e culturas na formação do país. A dica é: não consumir o que vem de fora e criar nossos próprios parâmetros, e por que não, fazer o exterior consumir.
***
Foi partindo de um livro sobre moda que ele chegou nessas conclusões... Oui, la mode est très important
Lipovetsky é o cara! Pena que perdi!
ResponderExcluirum dia ainda chego lá! rs
ResponderExcluirEste texto chegou numa hora ótima pra mim, que apesar de ser parte atuante neste mercado de compensação e que vai ao shopping pra se sentir bem (vício antigo, por sinal) ainda assim se incomoda com a própria postura.
ResponderExcluirBisous.
Excelente postagem! Obrigada por compartilhar a experiência.
ResponderExcluirParabéns pela iniciativa, pelo post e pelo blog.
Julia Salgueiro
Oi Laura!
ResponderExcluirBelo texto!
Você comentou no final que Lipovetsky partiu de um livro de moda para chegar a essas conclusões. Ele comentou que livro é esse?
Parabéns!
Beijos